domingo, abril 03, 2005

"Sin City" revoluciona adaptação de HQs
SÉRGIO DÁVILA
da Folha de S. Paulo, na Califórnia
"Sin City" é um marco. A cada punhado de anos, Hollywood produz um filme-marco, que influenciará os próximos títulos do gênero e será imitado à exaustão. Para ficar apenas nas décadas recentes, "Guerra nas Estrelas" inventou o blockbuster de verão baseado em efeitos especiais, "Blade Runner" mudou a ficção científica, "Pulp Fiction" reinventou a estrutura do roteiro, "A Bruxa de Blair" redefiniu o conceito de terror e "Matrix" juntou tudo isso e foi além. Agora, é a vez de "Sin City", que estréia nesta sexta nos EUA e chega em maio ao Brasil.
O filme, baseado em três episódios da série de graphic novel homônima, de autoria de Frank Miller, revoluciona a maneira como histórias em quadrinhos são adaptadas para as telas. De "Batman" (1989) a "Spider-Man 2" (2004), o que houve até agora foi um avanço no uso dos efeitos especiais a serviço do cinema. "Sin City" muda a linguagem. Seu trajeto, do primeiro quadrinho, desenhado no início dos anos 90, à obra pronta, mostrada a jornalistas do mundo todo no último domingo, vale a pena ser recontado.
Desde que juntou um bando de amigos, recolheu US$ 7 mil e fez "El Mariachi", em 1993, o texano Robert Rodriguez pensava em adaptar "Sin City" para o cinema. Ele não estava sozinho: se Will Eisner (1917-2005) inventou o conceito de "graphic novel" (linguagem cinematográfica aplicada à narração em quadrinhos) em 1978, com seu "Contrato com Deus", Frank Miller, 48, o levou às últimas conseqüências e virou objeto de cobiça dos estúdios.
Primeiro, ao tornar Batman de novo um super-herói, com a série "O Cavaleiro das Trevas", de 1986, que enterrou de vez o aspecto ridículo que tinha colado no personagem pela telessérie cômica dos anos 60. Segundo, por esta série de histórias que se passam numa cidade fictícia, que leva o slogan oficial de Las Vegas ("sin city", cidade do pecado), tem como nome completo Basin City (cidade do buraco), mas se parece muito com Manhattan, São Paulo e outras megaconcentrações urbanas.
O tempo é hoje, embora o clima seja dos romances e filmes noir dos anos 30 e 40, com seus "tiras", governantes e líderes religiosos corruptos, femmes fatales de coração mole e detetives particulares com ética inabalável. E violência, muita violência, decalitros de sangue, quilômetros de membros decepados, quilos de balas.
No dia do encontro com Miller, num bar, Rodriguez abriu seu laptop e falou: "Eu fiz isso". "Mas isso é literalmente minha HQ, quadro por quadro, como você conseguiu colocá-la em movimento?", espantou-se o autor. Nascia ali "Sin City", o filme.
Logo, os dois escolheram as três histórias que seriam adaptadas e como amarrá-las. Rodriguez fez questão de que Miller fosse co-diretor, o que o obrigou a se desligar do sindicato de diretores dos EUA, que proíbe tal prática. "Eu queria que ele estivesse lá para garantir que cada seqüência, cada cena, fosse fiel ao quadro que desenhou e que nunca perdêssemos este conceito de HQ em movimento", disse. Para complicar ainda mais a sua situação sindical, criou a categoria de "diretor especialmente convidado" para seu amigo Quentin Tarantino, que pilota uma das cenas mais violentas e cômicas do longa.

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