sábado, maio 14, 2005

PINTOU A PALMA DE OURO?
Enviado por Jaime Biaggio - 14/5/2005
Acho até que ainda não. Mas pintou o primeiro grande filme de Cannes 2005: Caché, do austríaco Michael Haneke (Funny Games - Violência Gratuita, Código Desconhecido, A Professora de Piano, pra situar quem possa não conhecer).
Haneke sempre faz filmes barra-pesada, lúgubres (ultimamente pegou uma mania de iluminar as cenas de menos, tornando os personagens sombras engolidas pelo ambiente e pelas suas culpas). Ele começa no registro habitual, mexendo com signos de instabilidade social e paranóia urbana, como em Funny Games e Le Temps du Loup, exibido aqui em Cannes há dois anos e nunca lançado no Brasil. Essa é a trama-base (um intelectual famoso e bem-sucedido recebe na porta de casa vídeos inquietantes - sua casa, filmada da rua em frente; a casa de sua mãe, filmada de um carro que passa ali por perto; tudo sem qualquer explicação, mas sugerindo que quem os está enviando o conhece não é de hoje).O intelectual é Daniel Auteuil. A mulher dele é Juliette Binoche.
Só que o caminho que o filme toma a partir daí tem algo de novo. Não só pelos rumos abstratos que toma em termos de resolução da narrativa, mas por algo que ouso - é, ouso, já que Haneke é visto por muitos como um diretor que adora pintar o ser humano como um bicho abominável - chamar de um certo carinho, uma pregação em nome da conciliação de diferenças, estabelecida na surpreendente cena final. Não dá pra ser mais claro que isso, sorry. Assim como em Lemming, assim como em Match Point, contar demais, no caso de Caché, estraga. Ainda que, nesse caso, eu tema que o filme não seja comprado para o Brasil.
Mas, pra resumir, não sei se o Haneke detesta o ser humano, não. Acho que ele, isso sim, tem a exata noção do quanto esse bicho escroto pisa na bola com seus semelhantes. Sei bem o que é isso. Não gosto muito de gente (assim, no genérico). Desconfio de gente. Tenho mesmo um certo receio. Ok, às vezes desprezo um pouco mesmo. Mas sempre me pego, em dados momentos, percebendo em mim uma tolerância inesperada, uma vontade de pensar "tá bom, tá bom, vamos dar uma outra chance pra esse estrupício do ser humano". Capacidade de perdoar, resumindo. E senti isso nele dessa vez. Quase um pedido de "pega leve", de um bicho homem para os demais.
Match Point, o novo Woody Allen, é uma delícia e uma revelação. Que ele já soube fugir ocasionalmente ao molde habitual dos seus filmes, todos nós já sabíamos. A dúvida era se ainda sabia. Francamente, Woody Allen andou morto da virada do século pra cá. Começou a renascer com Igual a Tudo na Vida, que me deixou curioso pelo filme seguinte, Melinda & Melinda, que não consegui ver ainda (estréia por aí na próxima semana, acho). Esse é uma surpresa muito bem-vinda.

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